terça-feira, 22 de junho de 2021

DIVERSIDADE NAS EMPRESAS - ANO 06 - EDIÇÃO 71 - JUNHO DE 2021



Muito além de apenas melhorar a imagem das marcas junto à população, a multiplicidade de perfis apresenta diferentes razões pelas quais é bom negócio adotá- -la. Segundo pesquisa, de 2020, da consultoria McKinsey, organizações que adotam a diversidade em suas equipes apresentam 93% a mais de desempenho financeiro, que seus concorrentes, e 14% mais chances de superar a performance de empresas rivais. 

Outra vantagem é que assim como acontece com certificados de empresas socialmente responsáveis, atribuições como o selo ESG (de governança ambiental, social e corporativa) fazem aumentar o valor de venda de uma organização e o preço de suas ações. A pesquisa considera o termo ‘diversidade’ para grupo de pessoas de diferentes origens étnico-raciais, idades, gêneros, orientações sexuais e para portadores de deficiências. Em março deste ano, artigo do CEO da empresa ClearSale (de segurança digital), Bernardo Lustosa, repercutiu nas redes sociais, após ele comentar a importância de empregar políticas empresariais e sociais para aumentar a diversidade nas organizações. 

Em texto publicado no site da organização Endeavor, ele defendeu mecanismos de inclusão polêmicos, como as cotas raciais para negros e indígenas. Procurado pela reportagem da RBA, ele explicou que o conteúdo se estende a todo tipo de pluralidade, não apenas o racial, e trata de temas como etnia, orientações sexuais, credo e até preferências políticas. Ele defende que a inclusão deve estar no mindset da empresa (comportamento e cultura organizacional).

 “A minha crença histórica é a de que as empresas precisam ser meritocratas e buscar as melhores pessoas do mercado. Dentro disso, é preciso escolher profissionais sem fazer distinção, por exemplo, de gênero, etnia e orientação sexual”, explica. Lustosa traz à tona, ainda, outro assunto polêmico que são os comportamentos inconscientes herdados de antepassados. O racismo, sexismo, homofobia e xenofobia (ódio a estrangeiros) podem ter suas raízes no fenômeno. “Infelizmente, vieses inconscientes fazem com que achemos que estamos escolhendo alguém por mérito, quando na verdade estamos dando prioridade para determinado grupo. Desse modo, impede o processo de escolha dos melhores profissionais”, ressalta.

Homofobia

Embora o tema seja tratado com desdém por muitos empresários e empreendedores, o preconceito existe nas organizações, de acordo com o administrador e gestor de recursos humanos, Edimar Freitas. Ele acredita que, de maneira geral, os brasileiros se veem como pessoas de mente aberta, mas que o problema é recorrente em âmbito organizacional. Ao embasar sua explicação, Freitas narra fatos enfrentados por ele, quando era gestor de RH, em empresa de seu estado, o Amazonas.

 Em certa ocasião, ele foi incumbido de negociar com sindicato que queria a paralisação total das atividades, em desacordo com a maioria dos funcionários. Como resultado da negação às demandas sindicais, o administrador conta que foi agredido fisicamente pelos sindicalistas, cuspido e repetiam a todo instante palavras ofensivas, relacionados à sua orientação sexual — conhecida dentro da empresa. Homossexual assumido, ele conta que levou sua indignação ao conselho diretor da empresa, em busca de apoio, e que foi tratado com desdém e piadas.

Na mesma instituição, ele relata que lhe foi levado o caso de uma profissional travesti, que era impedido de entrar no banheiro de homens e de mulheres. Novamente, ao levar o caso à diretoria, revela que ouviu piadas machistas, chacotas e ouvia a todo instante o termo “esse tipo de gente”, utilizado de forma pejorativa para referir-se ao funcionário. “Depois disso tudo, decidi não trabalhar mais para essa empresa, e fui para outro lugar. E sobre essa minha colega de trabalho que era travesti, decidiram pelo desligamento dela, após duas semanas de minha saída da instituição”, revela.

Racismo

Segundo o administrador e tecnólogo em gestão financeira, Gilvan Bueno, o racismo ficou ainda mais evidente durante a pandemia. Ele narra que pesquisa do Instituto Locomotiva aponta que 74% das pessoas que pediram auxílio emergencial eram negros desempregados. Ele defende mecanismos como a política de cotas empregada nos Estados Unidos, em que durante 50 anos a população negra recebe ajuda para estudos e apoio socioeconômico para inclusão na sociedade.

No Brasil, medida semelhante é de apenas 10 anos — a ser renovada dependendo da melhoria da qualidade de vida de negros e indígenas —, e tem como parâmetro a medição do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE). “Em 2019, o IBGE mostrou que das 13,5 milhões de pessoas que vivem em extrema pobreza, 75% são pretos ou mestiços. É preciso nove gerações para reparar o dano social causado pela escravidão, segundo dados da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), por isso, a medida brasileira é falha, mas ainda assim é uma atitude positiva”, destaca. Como empresário e proprietário da “Financier Educação”, Bueno destaca que afroempreendedores encontram, entre as principais dificuldades, a falta de acesso a crédito para iniciar e manter seus negócios.

Ele relata que são necessários 18 meses de funcionamento, e boa gestão, para fazer uma empresa dar certo. Além da dificuldade de crédito, não apenas financeiro, mas também social, ele avalia que o foco nos estudos e no trabalho são as melhores alternativas para sobreviver — sem depender de terceiros — e, depois, o empreendedorismo para enfrentar o racismo. 

No entanto, para alcançar o objetivo, ele recomenda que os postulantes tenham base técnica em administração, para gerenciar os negócios, e também construam rede de relacionamento profissional (networking). “No final, o acesso a uma excelente base educacional é o que melhora o desenvolvimento intelectual e econômico. E isso pode promover um aumento na renda e permitir uma grande transformação racial e social no Brasil”, finaliza.

FONTE: SANTOS, L. REVISTA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO, ANO 32 Nº 141 MARÇO/ABRIL 2021 p. 28-32.

Nenhum comentário:

Postar um comentário